sexta-feira, 21 de outubro de 2011

Quarto

Sentada na brisa de varanda, tragando mais um dia, mais uma experiência, mais um pouco de vida. Engraçado que quando perto do alimento necessário a morte não me sente fome. Eu sinto, sinto aquele arrepio, aquele som doce, você. A sombra se move e me envolve, até o dia de cair. Segurar-me-ei antes de tocá-la, eu sei, não preciso acreditar em palavras suadas de momentos, ou nos cantos sussurrados de qualquer hora – romantismo é seu ponto forte –, só preciso te abraçar de noite e vou saber que vai estar tudo bem. E quando desejar sair, eu juro que você vai estar pronto pra me proteger. No fundo, você acredita nas suas promessas. Eu também.

quarta-feira, 13 de julho de 2011

(Re)Construção


A alteração das bases do meu edifício me abala e me faz quase cair. Desconhecidos os andares da boa esperança, mas espero que ela esteja acompanhada de um pouco de paz. Os espíritos que assombram as minhas paredes não se cansam, como os da infância mal perdida. Insistem em dizer que estamos em caminhos diferentes, desgarrados de qualquer elo que nos unia, desapegados às promessas quebradas e ao futuro ilusório. A verdade é fria, e às vezes queima.
Eu acho que sonhei hoje à noite. Frutos de saudade nasciam ao pé das minhas fontes, era um amor incabível, típico de despedidas. Eu acho que foi um sonho, mas acordei com o vazio da partida e um a menos. Sou roupas limpas secando ao sol, e, ao fim do dia, serei usada e suja novamente, até que me lave de todos os pecados. E os sorrisos mal estampados e as lágrimas secas voltarão a ser rotina. Espero que um dia me sustente com minhas próprias colunas sólidas, mas ainda deixo minhas janelas abertas para receber o sol e a ventania, enquanto minhas portas continuam fechadas. A verdade é fria, e, agora, queima.

segunda-feira, 4 de julho de 2011

Cenário


Ei, olhe pra mim. Digo para mim mesma quando vou embora, me deixando viva em mim, de qualquer forma. Não me reconheço quando olho no espelho e procuro a garota do olhar gentil. No lugar disso vejo incontáveis cicatrizes ora feitas por mim, ora feitas por mim em relação ao mundo. Ninguém é culpado, até que me prove a justiça eleita a troca de papel sujo e abuso e escravidão. Estou desesperada, mas não hei de entregar minha alma e corpo para objetos ósseos, cuja função é deteriorar toda a vida que há em cada que vive. Talvez para matar sua fome - não.
Ei, ouça a voz que nasce de dentro da fantasia e vem te acordar da vida real. Se for isso que deva ser, seja, mas deixa-me enfeitar o carrossel que misturará a bossa e a tristeza sólida que nos consome numa massa ilusória de normalidade. O solo de guitarra quebrará meus pratos, enquanto eu estarei sentada aos pés do violão, pedindo um pouco de paz. Respirando fundo, esquentando seu lugar na cama... Há tempos que não lhe vejo. Digo, não te vejo em carne, já que me visita constantemente. Eu sei que sim. Estávamos lindos admirando a despedida calorosa e avermelhado da tarde, pequenos pontos brancos anunciavam previamente a entrada da noite à cena. A vista panorâmica compusera um plano de fundo, mas o que realmente valia sob o céu vermelho, era um pequeno amor encarnado em três corpos. Tanta vontade...
Agora eu sei que não devo confiar em mim, ou me mato de novo. Não confie tanto em mim, flores, ou nos mato para sempre. E quem há de se servir do nosso enterro? O céu é divino, e disso me faço muito pouco. Na verdade, eu nunca fui fiel a tais crenças. Sei que em algum lugar em mim, onde me escondo em segurança, há um pouco de tudo que realmente é divino – e não recito minha invenção de Deus, Ele merece meu descanso– ou pelo menos tudo que conheço. Um amor, três corpos enfeitados e revestidos por um manto vermelho quente, com brisa forte e mansa a banhar um dos mais divinos nascimentos. Ei, durma dentro de nós. E quem sabe assim seja eterno.

domingo, 19 de junho de 2011

Um Pouco de Outono

Carruagens que nos encaminha direto ao tanto de nada, corredores com cascalhos velhos, folhas secas que caem para nos festejar. Uma bela moça, um vestido branco, e sonhos mal realizados. Já eu, eu desisti de visualizar o futuro próspero que nunca chega, simplesmente agora os fantasio tingidos numa lona, com toda a esquisita e uma orquestra circense. Belos cavalos brancos, e a carruagem segue. Ora, senhores, liberte-me e assim brincarei de viver. Liberte-se e sua vida será. Pesadelos que nos assombram à noite serão fortes o suficiente para destruir toda a vida que dança dentro de você, e que você almeja, e agora me fantasio e me assombro e me conquisto. E logo vou embora.
Trompetes anunciam nossa chegada, as folhas ainda despencam com uma leveza bendita, e não há qualquer catástrofe que nos desperte à realidade. Caso queiram isso, não os impeço, mas me deixe ser mais bonita. Quero tingir de alma toda a vida que nos cerca, e me (re)vestir dessas cores. Quero brincar de ser a luz que lhe ilumina, e você, a neblina que me abraça. E numa fusão de tons e sonhos mal dormidos, lhe arrostar enquanto minha respiração entra na sua. Esquecer de inventar e culpar Deus, e sentir uns aos outros. Em qualquer lugar. Antes de sair e ir embora. Da gente. E, antes de ir, libertar, meu anjo.

terça-feira, 14 de junho de 2011

Extravagante


Descansada nas próprias asas curtas da razão, me perdi quando te conheci. Não era a vodka, ou as palestras irracionais de qualquer droga: simplesmente desapareci de mim, e, logo, estava visitando sua casa. Ora, meus pés respondiam por mim, mas quem era eu para responder a mim mesma? Uma viciada, uma dependente, e logo a resposta vinha como uma brisa em minha mente. Sim, viciada em teu perfume, dependente de teu toque. Quem sou eu para fugir? Uma mera marionete do grande show do amor. E quem sou eu para parar, se nem na minha respiração e em muito menos em meu coração consigo mandar.
Sei que tudo parece clichê, mas ando tão romântica que desconheço e mal me importo com o chão que me pisava, e com as sombras sem rosto que me rodeiam. Tanto faz se estou aqui, ou na vida (ir)real, eu estou, e isso, isso ninguém pode me tirar. De você. E você de mim. Ligados por um sentimento mais que normal, uma coisa não tão trivial, abrindo meus olhos e entrando em nosso mundo, onde aqueles que nos proibiram não reinam mais, e em seu colo posso me encostar e encontrar minha paz. Sem sequer reparando nos males que nos perseguem, mas de vez em quando, criando os nossos próprios demônios. Fazendo-nos arder em nosso próprio inferno.
Céu é para os dignos, que com medo de viver se escondem na vida normal que, ao contrário de nós, amor, que vivemos por viver sem prezar pelo amanhã, sem pensar no depois. Só no amor e no agora, no nosso castigo pedido particular. E quem sabe haja um fim a nos arruinar, a quebrar todas as nossas promessas individuais feitas para nós, e que nós sejamos os mesmos seres. Não, não seremos: nos deixamos levar pelas correntezas do maior íntimo, e de individuais viramos individual. Tornamo-nos tanto um do outro. Somos um tanto de três em um. Um tanto de eu em você, e você. Tanto.

 
Eu, você e você. Um pouco de nós. 


Por B. Estiano e Edd Rodrigues

segunda-feira, 16 de maio de 2011

Fotografia


Fotografo com os olhos o que não posso reparar. A mente (des)anda e flutua em rios de memórias do que eu ainda não vivi. Eu estou sorrindo de tão leve que não sinto. Você está tão perto que lhe sinto. Aqui. Agora. Há tempos não sentia, mas agora eu vejo. Fotografia. Somos objeto do passado e ele nos consome. Por hora, esqueço. Recebo-lhe e me traz uma flor - nunca fui boa conhecedora. Mas era um frasco, e nele continha a essência da sua alma. E era minha. Éramos nossos.
Nenhuma catástrofe televisiva parece maior do que o que temos agora, e ela está ligada, mas para nos observar. Admirada... Nenhum calor é tão terno quanto o calor que rola de um lado para o outro no chão da sala. Dia de chuva. Sorrisos tão intensamente satisfeitos, como se nos alimentássemos um do outro. Nada é tão sincero a ser sempre verdade, mas é puro. E a áurea cândida que nos rodeia também nos guia, e, sabe-se lá onde iremos parar, estamos indo. Muito bem.
A felicidade está ligada a tantas relações, mas me contento em ser só feliz. Mesmo que o futuro não seja o mesmo que seria hoje em dia, eu vou ser feliz. Ou vou estar. Ou vou tentar. Deixar ser. O que tiver que ser, pode ser que seja. E eu estarei lá. Estarei aqui. Enquanto fotografo com os olhos tudo que não se pode ver: uma flor que não sei de nome, mas conheço de essência: absorvo-a e completo-a. E seremos nossos.  

quarta-feira, 27 de abril de 2011

Urbano Central


Tudo que resta do ontem é a saudade do amanhã. Adeus. Saudade do futuro desperdiçado pelo presente de planos tolos, uma xícara de café subordinada e mais um acidente na via principal, atrapalhando o fim de semana e a volta para casa. O único desejo conjunto é o desejo em comum - o que não significa uma transmissão de pensamento. Sonhar sonhos tão curtos e realizáveis te satisfaz em não ser tão impotente e desnecessário. Só dói quando não se acredita. E quando respiro.
Alguma coisa falta, mas não se sabe, não se vê. Viva ou morra. Em casos, é quase a mesma coisa. Morrer nunca é opção: é consequência - ou não. Trinta e oito fatores determinam seu dia, quarenta e dois fecham os seus olhos. Um, apenas um, desequilibra seu corpo e alimenta sua alma. Mas não se ama, não se vê. A alma é pobre. Está. E pode-se fazer alguma coisa. Pode-se fazer absolutamente tudo. Embora suas leis não te permitam viver com o peito, pode-se. Deve-se. Foda-se.
A energia e a preguiça do corpo me impedem de ser pisoteada pelas minhas próprias ambições. Eu sigo. E o coração se destrói a cada verdade mundana. Eu sigo. Refaço e caio, mas não paro. Sigo. Insistir parece idiota, mas eu faço preciso. Adio e me renovo. E, assim, sigo. Enquanto não se morre, vive-se. Talvez o que falte é um meio termo. Mas não quero. Sigo, já que é inevitável. Compreende?